A discriminação por gênero encontra-se presente em praticamente todas as sociedades, independentemente dos traços culturais e religiosos, e dos sistemas políticos e econômicos. As mulheres são discriminadas no mercado de trabalho e, apesar de igualmente qualificadas, recebem pagamento inferior no desempenho da mesma função e/ou recebem salários menores porque têm acesso apenas às ocupações pior remuneradas.

Nessa conjuntura atual bastante adversa, vem acentuando-se a violência de gênero, a violência física, sexual e psicológica contra a mulher, o que podemos afirmar como uma manifestação das relações de poder historicamente desiguais estabelecidas entre homens e mulheres.

A decisão judicial recente sobre o caso de estupro da Mariana Ferrer chocou a sociedade sobre a criação da nova modalidade de crime para conceituar a violência do estupro. Apesar de não pertencer à área jurídica, considero algo escandaloso essa decisão. Não quero tratar da parte técnica do processo penal, mas da humilhação e crueldade imposta a uma mulher em um espaço público que deveria protegê-la.

A cultura do estupro protege o criminoso e crucifica a vítima. Essa foi a sentença dada por um Judiciário machista e patriarcal a Mariana Ferrer. O estuprador e empresário André de Camargo Aranha saiu livre, leve e solto.

Lamentavelmente, este caso escancara a cultura do estupro em nosso país. O Brasil se encontra entre os países mais violentos para as mulheres. Somente em 2018 foram registrados 180 casos de estupro por dia, o que significa mais de 66 mil casos em um ano, sendo que 54% das vítimas têm menos de 13 anos, cerca de 81% são do sexo feminino e 51% são mulheres negras (dados do 13° anúario de Segurança Pública, 2018).

Além dessa questão, que configura um retrocesso para o combate à violência contra a mulher, há uma preocupação sobre o papel do Judiciário. Este não deveria ter assegurado o atendimento mais humanizado à vítima? E qual é a política judiciária nacional? Segundo o CNJ, “configura violência institucional a ação ou omissão de qualquer órgão ou agente público que fragilize, de alguma forma, a preservação dos direitos das mulheres”.

Essa decisão judicial reforça ainda mais a possibilidade de culpabilização das mulheres e a permissividade do estupro. Estudo realizado pelo Fórum de Segurança Pública, em 2016, mostrou que 43% dos brasileiros do sexo masculino maiores de 16 anos acreditam que “mulheres que não se dão ao respeito são estupradas”. O estupro tem, portanto, no componente cultural o seu grande sustentáculo e fator de perpetuação.

A possibilidade de liberdade sexual precisa ser perseguida, violada, a fim de manter essa estrutura patriarcal, machista e exploradora que, além de utilizar o trabalho reprodutivo não pago das mulheres, também nos reserva os piores e mais desgastantes trabalhos, bem como menores salários devido à condição de gênero, sexual e racial.

Portanto, o grande desafio dos movimentos sociais e dos poderes públicos, comprometidos com a igualdade e a justiça social, é contribuir para que se eliminem as desigualdades entre homens e mulheres e se fortaleça a autonomia feminina nos diferentes espaços da vida cotidiana.

Nesse sentido, é preciso garantir a instalação de equipamentos sociais, como casa de saúde, delegacias especializadas de atendimento às mulheres, e intensificar nossa ação enquanto sociedade civil para que a Lei Maria da Penha seja efetivamente implementada pelos poderes locais e garantir a política para o fim da violência contra as mulheres, incluindo ações para erradicação da violência em todos os sentidos.

Entendemos que a diretriz da igualdade de gênero entrou para a agenda das políticas públicas. Em nossas escolas devemos educar crianças, jovens e adultos de diferentes etnias, gêneros e origens sociais e culturais para se tornarem pessoas capazes de desenvolver todo seu potencial na sociedade. Isso só é possível se a igualdade, na diversidade, for estabelecida como parâmetro comum.

Dentre as diferenças, uma das que mais chama atenção é a de gênero. Houve um tempo em que o que hoje chamamos de preconceito sexista era a norma na sociedade. Homem não chora; lugar de mulher era na cozinha; era ele o responsável por sustentar a casa, enquanto à mulher cabiam os cuidados e a educação dos filhos.

As mulheres foram às ruas, reivindicaram e conquistaram direitos. Aos poucos, a sociedade foi se transformando para que a linha que separa homens e mulheres seja cada vez mais tênue. Não podemos aceitar retrocessos!

É necessário ampliar os referenciais para uma NOVA PEDAGOGIA e um NOVO PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO NAS ESCOLAS, que entrelacem as diversas perspectivas de classe, raça/etnia e gênero, alterando as pautas valorativas que permeiam as interações multifacetadas entre os sujeitos no cotidiano escolar.

 

*Guilhermina Rocha é especialista em educação, historiadora, coordenadora da Secretaria de Formação da Contee e presidenta do Sinpro Macaé e Região

 

FONTE: http://contee.org.br/

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